Thursday, January 15, 2015

Ser ou não ser Charlie, eis a questão.

Bem, este tema é extremamente complexo, por isso meu objetivo é levantar perguntas e fatos para a reflexão.
Na verdade são muitas perguntas para poucas respostas.


Mas vamos lá, qual o limite da liberdade de expressão? Tem que haver limite? E no caso de haver, como determiná-lo? Pois é, aí que surgem as contradições. Para retratar Maomé, o Papa, ou qualquer outra figura religiosa, aparentemente não existem limites. A liberdade de expressão está acima do politicamente incorreto em nossa sociedade de base anglo-saxônica. Então fazer piadas dos atentados de Paris também é possível, certo? Não, neste caso as forças francesas têm detido comediantes que ousam tocar neste assunto tão “delicado” em seus stand-up comedy. Mas isso não é contraditório? Aliás, não existem outros temas tão delicados quanto este? Bem, o islamismo possui um principio fundamental que proíbe qualquer tipo de retratação do Profeta. Este não seria então um tema sobre o qual teria que se tomar certo cuidado? Pois é, pelo jeito existe uma linha (não muito tênue) que realmente divide os mundos, e que tem fomentado a intolerância religiosa.

De um lado, uma sociedade ocidental alienada a valores de posse, que vem enterrando dia a após dia os princípios morais e éticos que um dia a sustentaram, e cuja religião predominante (o cristianismo, que um dia já foi imposto ao mundo inteiro) vem perdendo vertiginosamente seus fies devido ao grau de banalização que se encontra. De outro lado, a maior religião do mundo em número de adeptos, cujos hábitos, costumes e valores daqueles que a seguem (os muçulmanos) estão muito vinculados à obediência religiosa (preceitos do Alcorão) e são bem diferentes daqueles que conhecemos no ocidente. E são justamente estas diferenças que são questionadas por muitos, que enxergam ali uma influência perigosa a sua cultura, haja vista a quantidade de imigrantes muçulmanos em seus territórios. E é desse fato que muita gente têm se utilizado para ofender, agredir e humilhar com um lápis e um papel. É a palavra que mata.

Mas se por um lado o ocidente generaliza o julgamento deste povo a partir de ações de uma minoria que aterroriza o mundo a partir de interpretações radicais, por outro lado, por que existem tantos muçulmanos imigrando para democracias ocidentais de culturas tão diferentes?
Talvez valha a velha frase de Churchill: A democracia é a pior de todas as formas de governo, excetuando-se as demais.

Mas o fato é: a liberdade de expressão deve ter limites para impedir a intolerância religiosa? 
 
Em existindo agressões a religiões ou religiosos, seja através de uma charge ou não, sempre haverá pessoas ofendidas. A questão é: no caso da ocorrência desta situação, existem canais acessíveis a estas pessoas para manifestarem a sua insatisfação? E eles são efetivos?

Pois bem, na época das primeiras publicações ofensivas ao Islã na França, diversas associações islâmicas se sentiram agredidas e decidiram processar a revista que os publicou. Porém, os tribunais franceses deram ganho de causa para a revista. Este fato serviu de incentivo para que a Charlie Hebdo intensificasse as charges e textos contra o Islã.

A justiça deve ser justa, não? Será que a justiça chega de forma equilibrada àquelas minorias marginalizadas das nossas sociedades? Às minorias étnicas e religiosas?

Há quem diga que quando mais se insiste em algo, mas as pessoas acreditam. Ou seja, quando um muçulmano é retratado com armas e bombas repetidas vezes, cria-se um estereótipo de que todo muçulmano é terrorista. E isso não é verdade. Mas qual o limite para a representação generalizada de alguém?

O fato de alguns aceitarem piadas preconceituosas deve servir de base para que todos as aceitem? Aliás, essa é uma das defesas feitas a Charlie Hebdo, o fato dela fazer piadas sobre tudo e todos. Mas a velha máxima já dizia: “cada cabeça é uma sentença”, logo, públicos diferentes terão reações diferentes, isso é lógico ou não?

Outra pergunta interessante: um jornalista tem ou não responsabilidade pelas informações que publica? Caso tenha, não precisa ter cuidado com o que veicula? Seja para preservar a fonte, seja para manter a credibilidade do meio de comunicação utilizado ou a sua própria reputação. Ou mais importante ainda, para trazer algo de útil a sociedade. Pior que hoje as inutilidades é que dão maior audiência, não?

Dá para fazer piada sem ser preconceituoso? Ou sempre vai ter uma raça, uma opção sexual, uma religião servindo de alicerce para a piada. As piadas sobre os mais fracos, as minorias, os marginalizados são dignas de risadas? Ou mostram o despreparo do autor em tratar de assuntos mais complexos, como: política e economia?

Enfim, muitas perguntas e poucas conclusões.
Talvez a única conclusão que se possa tirar, e que não será parcial, é que nada justifica os atentados terroristas ocorridos na França.


Agora, ser o não ser Charlie, eis a questão.